RECURSOS CONTRA O GABARITO PRELIMINAR DA 1ª FASE DO 39º EXAME DE ORDEM
RECURSO QUESTÃO DE ÉTICA
CORRESPONDÊNCIA:
2 da prova Branca
3 da prova Verde.
4 da prova Amarela.
6 da prova Azul.
Trata-se de RECURSO visando a anulação da presente questão, que versa sobre advogada Aline Santos, investigada em conjunto com seus clientes Robson Lima e Leonardo Melo, cujo teor se transcreve:
“Alice Santos, advogada, está sendo investigada criminalmente por ter, supostamente, cometido fraude contra o sistema previdenciário, em conjunto com Robson Lima, seu cliente, e Leonardo Melo, seu ex-cliente. O órgão competente do Ministério Público consulta a Dra. Alice Santos sobre seu interesse em efetuar colaboração premiada. Com base na legislação aplicável, assinale a afirmativa que apresenta, corretamente, o que ela concluiu.”
A banca comunicou no gabarito preliminar que estaria correta a seguinte alternativa: “Caso efetue colaboração premiada contra Leonardo Melo, estará sujeita às penas do crime de violação do segredo profissional”.
Respeitosamente ao entendimento esposado pela digna Banca, a análise da questão revela vício insanável que leva à anulação da questão, senão vejamos.
A questão indaga sobre a possibilidade de que a Advogada Alice Santos realizar colaboração premiada em razão de crime de fraude que perpetra conjuntamente com Robson Lima e Leonardo Melo, significando dizer que os três são co-autores e que portanto figuram no polo passivo do crime de fraude contra a Previdência. Sobre o assunto, claro é que a delação pode ocorrer em razão do disposto no § 7º do artigo 7º da do Estatuto da Advocacia e da OAB, que determina “§ 7º - A ressalva constante do § 6º deste artigo não se estende a clientes do advogado averiguado que estejam sendo formalmente investigados como seus partícipes ou co-autores pela prática do mesmo crime que deu causa à quebra da inviolabilidade”.
A ressalva do artigo 6º esclarece que quando se trata de co-réu ou partícipe, há a possibilidade de se realizar a busca e apreensão no escritório do advogado, seguindo com base nessa premissa, os demais desdobramentos do parágrafo, como se tem no desdobramento que é o § 6º-I que veda ao advogado efetuar a colaboração premiada, que está atrelado à cabeça do parágrafo 6º que, no §7º encontra sua liberação nos casos de se tratar advogado e cliente co-autores de crime.
Nesse norte, colaciona-se o bem lançado texto dos autores MARCELO RODRIGUES DA SILVA TORRICELLI e FILIPE MAIA BROETO no artigo “Necessária separação entre confiança e omertà com advento da Lei 14.365/22” (Consultor Jurídico, 15 de junho de 2022), que bem explica a situação contemplada equivocadamente na questão, conforme se transcreve:
“O CÓDIGO DE ÉTICA E DISCIPLINA DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), EM SEU ARTIGO 37, É EXPRESSO NO SENTIDO DE QUE "O SIGILO PROFISSIONAL CEDERÁ EM FACE DE CIRCUNSTÂNCIAS EXCEPCIONAIS QUE CONFIGUREM JUSTA CAUSA, COMO NOS CASOS DE GRAVE AMEAÇA AO DIREITO À VIDA E À HONRA OU QUE ENVOLVAM DEFESA PRÓPRIA". DO MESMO MODO, O ARTIGO 34, INCISO VII, DO EAOAB DEIXA CLARO QUE NÃO HAVERÁ VIOLAÇÃO DO SIGILO PROFISSIONAL PELO ADVOGADO QUANDO PRESENTE A JUSTA CAUSA. O PRÓPRIO CRIME DE VIOLAÇÃO DE SEGREDO PROFISSIONAL (ARTIGO 154 DO CÓDIGO PENAL) NÃO CONSIDERA TÍPICA A CONDUTA DE VIOLAÇÃO DE SEGREDO PROFISSIONAL QUANDO HOUVER JUSTA CAUSA.
NOTA-SE QUE NENHUM DOS DISPOSITIVOS CITADOS FORAM REVOGADOS PELA LEI 14.365/2022, RAZÃO POR QUE SE MOSTRA NECESSÁRIA UMA LEITURA SISTEMÁTICA E CONSTITUCIONAL DO DISPOSTO NO §6º-I DO ARTIGO 7º DO EAOAB, DE MODO A PERMITIR A COLABORAÇÃO PREMIADA POR PARTE DO ADVOGADO QUANDO HOUVER JUSTA CAUSA, COMO É O CASO DE UTILIZAÇÃO DO INSTITUTO EM SEU FAVOR, COMO MECANISMO DE AUTODEFESA.”
Portanto, a leitura sistemática do Estatuto da OAB conforme exposto, deixa claro que a vedação para a realização da delação premiada esbarra na condição em que o advogado figura como CO-RÉU ou PARTÍCIPE do crime.
Assim, sendo certo que o sigilo profissional no caso em que o advogado e o cliente estão incursos na MESMA INVESTIGAÇÃO PELO MESMO CRIME ingressa como autorização a questão da delação como JUSTA CAUSA.
Se não fosse suficiente os motivos acima desfilados, que já derrubam a questão por força do artigo 7º do EAOAB, o Código de Ética e Disciplina da OAB, ao tratar do sigilo 37, estampa que o advogado não responde por quebra de sigilo presente o caso da PRÓPRIA DEFESA, verbis:
“ARTIGO 37 – O SIGILO PROFISSIONAL CEDERÁ EM FACE DE CIRCUNSTÂNCIAS EXPECPCIONAIS QUE CONFIGUREM JUSTA CAUSA, COMO NOS CASOS DE GRAVE AMEAÇA AO DIREITO À VIDA, À HONRA OU QUE ENVOLVAM A PRÓPRIA DEFESA.
Ora, se o Código de Ética e Disciplina da OAB autoriza o advogado excepcionalmente a quebrar o sigilo para a sua própria defesa QUAL A RAZÃO DA ADVOGADA ALICE SANTOS RESPONDER POR VIOLAÇÃO DE SIGILO SE A QUESTÃO DEIXA CLARO QUE SÃO CO-AUTORES? NÃO HÁ.
Com todo o respeito, repita-se, seja à luz do Estatuto da Advocacia ou da OAB, seja à luz do Código de Ética e Disciplina, não há como se imputar à advogada a responsabilidade pela delação, a uma porque o EAOAB no artigo 7º, em seus parágrafos 6º, 6º-I da Lei 8906/94 e ainda invocando o artigo 37 do Código de Ética e Disciplina da OAB, razão pela qual a questão deve ser ANULADA, evitando prejuízos aos alunos que estudaram o tema e estão com toda a legislação ética do advogado a justificar a anulação da referida questão.
Confiante, pede deferimento.
RECURSO QUESTÃO DE ECA
Correspondência :
43- PROVA BRANCA ;
44- PROVA VERDE;
44- PROVA AMARELA;
43- PROVA AZUL
“Carlos e Joana, pais da criança Paula, estão dissolvendo sua união estável ainda sem judicialização, detendo Joana a guarda de fato de Paula enquanto não regularizados os regimes de visitação ou compartilhamento da guarda.
Por razões profissionais, Carlos mudou-se para o município contíguo ao da residência de Joana e Paula.
Ocorre que Carlos, estando insatisfeito com algumas decisões de Joana sobre a vida da criança, e não mais conseguindo ajustar amistosamente tais questões,
precipitou o ajuizamento de processo para regulamentação da guarda e pensionamento, no Juizo da comarca em que está residindo.
Joana procura você, como advogado(a), para representá-la, reclamando de ter que se defender em outra cidade.
Com base no enunciado acima, sobre a questão da competência, assinale a orientação que você, corretamente, daria à Joana.”
A banca apontou como alternativa correta, no gabarito preliminar , a seguinte questão :
“ A competência para este processo de regulamentação de guarda e pensão incumbe ao Juízo da comarca de residência de Paula, e não de Carlos, pois a guarda de fato já basta para tal fixação.”
Em que pese o respeitável entendimento trazido pela digna Banca, a análise da questão revela vício insanável que leva à anulação da referida questão, senão vejamos :
A questão traz um cenário que apresenta dissenso entre os pais no tocante a guarda da criança, que reside com a mãe .
Sobre o tema , é importante destacar que o Estatuto da Criança e do Adolescente( Lei 8069/1990), em seu artigo 1 dispõe sobre o metaprincípio da proteção integral à criança e ao adolescente. O ECA normatiza sobre todos os aspectos da vida da pessoa em desenvolvimento estejam em situação regular ou não , é o que a doutrina chama de “proteção integral “, que veio de encontro ao normatizado na própria Constituição Federal , art 227, que no desiderato de mostrar os novos rumos da política quanto ao tema trouxe a lume a expressão “ prioridade absoluta “ , que se traduz , no caso concreto, na adoção da interpretação mais favorável às crianças e adolescentes ( princípio do melhor interesse da criança ).
Tal princípio preleciona que , no caso concreto, devem os aplicadores do direito buscar a solução que proporciona o maior benefício possível para o menor . Trata-se de princípio constitucional estabelecido no art 227, da CF , com previsão no art 100, parágrafo único , II , do ECA, consoante se verifica :
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários.
Parágrafo único.
São também princípios que regem a aplicação das medidas:
II - proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares;
Tais dispositivos determinam a hermenêutica que deve guiar a interpretação do exegeta . O norte nessa seara deve buscar a máxima efetividade aos direitos fundamentais da criança e do adolescente, especialmente criando condições que possibilitem o atendimento ao superior interesse do menor .
Embora a competência para julgar ações que envolvam guarda de menores seja a do domicílio do guardião, efetivamente ainda não havia a guarda legal estabelecida na situação trazida na questão . Entretanto, ainda que houvesse a referida guarda e apesar do que trata a Súmula 383 do STJ : “ A competência para processar e julgar as ações conexas de interesse do menor é, em
princípio do foro do domicílio do detentor da sua guarda “, não se pode deixar de observar a prevalência do princípio do melhor interesse do menor em qualquer situação que envolva a necessidade de garantir a sua proteção integral .
Portanto , a melhor solução para os conflitos de competência suscitados nos processos que envolvem menores não é verificar qual o juízo ou quem deferiu a guarda provisória antes, o em qual juízo iniciou-se a demanda , mas sim detectar aquele que, de acordo com os fatos delineados nos autos, melhor atende ao princípio da prioridade absoluta dos interesses da criança ou do adolescente.
Inclusive este é o entendimento da Segunda Seção do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi firmado em sede de conflito de competência suscitado nos autos de ação para regularização de guarda de duas crianças, de três e seis anos, disputada pelas avós.
As regras , portanto , são relativizadas em matéria de Infância e Juventude .
Forte em tais razões e com toda deferência , é imperioso reconhecer que , em matéria de Direitos da Criança e do Adolescente , prevalece como melhor critério de interpretação o superior interesse do menor, em qualquer situação , seja por força do ECA , seja por força da CF/88, seja pela forma como o Superior Tribunal de Justiça enfrenta a matéria. Dessa forma ,
a questão deve ser ANULADA, evitando prejuízos aos alunos que estudaram o tema e estão com toda a legislação relacionada e respectivos princípios norteadores dos direitos da criança e do adolescente a justificar a anulação da referida questão.
Confiante, pede deferimento.